YOOtheme

Homilia no 1º Domingo do Advento

Ordenações de Diáconos Mosteiro dos Jerónimos, 27 de Novembro.

 

1. Hoje iniciamos o tempo litúrgico do Advento, profundamente marcado pela virtude da esperança. Valor essencial de toda a vida cristã, a nossa sociedade vive tempos em que é urgente cultivar a esperança, anunciá-la através do testemunho daqueles que confiam que se Deus está connosco, estamos salvos. Desta esperança que encontra o seu fundamento na presença de Deus no meio de nós só os crentes podem ser testemunhas. Esta dimensão sobrenatural não anula a esperança humana, antes ajuda os homens a encontrarem o verdadeiro fundamento da sua confiança.

É por isso que o Advento é um tempo litúrgico marcado pela esperança. Celebramos a definitiva presença salvífica de Deus a agir no meio do seu Povo e no coração dos homens, em Jesus Cristo, Deus incarnado que nos redime e através do dom do Espírito Santo nos inspira a viver todas as realidades humanas com nobreza e grandeza. Cristo é, continua a ser, Deus a agir no meio do seu Povo, com a força da sua Páscoa, com o seu amor de Bom Pastor, com a luz do Espírito Santo, com a promessa da sua última manifestação para a transformação definitiva da história. O Advento é um tempo abrangente de todas as etapas da esperança: dos que esperaram, longamente, a vinda do Messias; dos que acreditam que Jesus é Deus no meio de nós, no âmago da nossa história; dos que esperam continuamente que Deus se lhes manifeste; dos que aguardam a última vinda do Senhor, para salvar definitivamente a humanidade.

2. Perante a necessidade de redenção do Povo de Israel o Profeta Isaías pede que Deus desça do Céu e Se manifeste no meio do seu Povo: “Voltai, por amor dos vossos servos e das tribos da vossa herança. Oh, se rasgásseis os céus e descêsseis! Ante a Vossa face estremeceriam os montes!” (Is. 63,19). Perante a realidade da nossa sociedade, nós os crentes que sabemos que só com a acção de Deus a humanidade se transformará, apetece-nos clamar como o Profeta: descei, Senhor, lá do alto dos céus, sede Deus connosco, mostrai a vossa força transformadora, porque “nosso Pai e nosso Redentor, é desde sempre o Vosso Nome” (Is. 63,16). Mas o mesmo Profeta dá a resposta a essa nossa prece: “Mas Vós descestes… Vós saís ao encontro dos que praticam a justiça e recordam os vossos caminhos” (Is. 64,4). Esta certeza de que Deus já desceu e veio ao nosso encontro no seu Filho Jesus Cristo é o centro da nossa fé, o fundamento da nossa esperança. É esta certeza de fé que a Igreja recorda no Advento. Em Jesus Cristo, Deus revelou- Se, definitivamente, como Deus connosco, a agir no dia-a-dia da nossa realidade. Ao comunicar-nos o Espírito Santo revelou-nos que a força que pode transformar os homens é o seu amor, é o nosso amor uns pelos outros, que encontra a sua fonte, não apenas na força da natureza, mas no amor de Deus, Ele que nos amou primeiro. Esta certeza de fé, que é experiência de salvação, é proclamada por Paulo na sua primeira Carta aos Coríntios: “Dou graças a Deus a vosso respeito pela graça divina que nos foi dada em Cristo Jesus. Porque fostes enriquecidos em tudo: em toda a palavra e em todo o conhecimento; e, deste modo, tornou-se firme em vós o testemunho de Cristo. De facto, já não vos falta nenhum dom da graça” (1Cor. 1,4-7).

3. Se já não nos falta nenhum dom da graça, então o que é que nos falta para sentirmos a acção de Deus, para vermos, hoje, a salvação a acontecer? A abertura do coração dos crentes a este dom de Deus, que é Jesus Cristo, o Deus connosco. Temos de escutar a sua Palavra como expressão do que nos quer dizer em cada momento; temos de nos deixar invadir pelo Seu amor, acreditando que só o amor transforma o mundo; seguirmos os caminhos da graça de que Ele dotou a sua Igreja; termos a simplicidade de travarmos as nossas lutas e percorrer os caminhos da vida, na simplicidade dos gestos sacramentais; deixarmos que Ele nos transforme, para podermos confiar que Ele transformará o mundo. Ele já veio e não está ausente dos caminhos dos homens; nós é que nos afastamos d’Ele.

A esperança depende da fidelidade dos cristãos, da sua busca da santidade. Nem sempre percebemos como é que a transformação que Ele realiza em nós, se repercute na transformação do mundo. Mas Ele sabe. Uma coisa é certa: Ele quer uma Igreja Santa, que seja fermento na massa, ou, na expressão do Concílio Vaticano II, sacramento de salvação. O advento só será tempo de esperança se aprofundar, em nós, o ardor da santidade. Nesse ardor entrecruzam-se todos os grandes desafios que o Santo Padre nos lança: Nova Evangelização, Ano da Fé, aniversário do Concílio.

4. Esta certeza de que o Senhor não está ausente, exprime-se, hoje, nesta celebração, na administração do sacramento da Ordem, a diáconos que daqui a meses serão presbíteros. Este sacramento é uma experiência maravilhosa de que Deus age, não de forma mítica, mas transformando os homens, dando-lhes o poder de agirem com a força de Deus, de serem a expressão visível e sensível de que Deus não abandonou o seu Povo.

Maria foi a primeira criatura a deixar-se transformar completamente pela acção de Deus. Ela continua a ser a expressão viva da presença de Deus no mundo. Continua a entregar-nos o Seu Filho Jesus. E se na sua vida pessoal ela participa da intimidade do amor trinitário, como instrumento de salvação, continua a atrair-nos com a força do amor de Deus. Rainha do Advento, porque é, realmente, estímulo da nossa esperança e causa da nossa alegria.

JOSÉ, Cardeal-Patriarca